Translate

Por Ana Paula Kwitko

sábado, 4 de junho de 2016

JULIA K, 13: ¡GRACIAS!


Lembro como se fosse anteontem: a menina nasceu, bocuda e olhuda. Os olhos, vá lá, mas a boca enorme me assustou: comentei ligeiramente sobre ela com Ana para não criar trauma pós-parto. Mas logo se reduziu e ficou a adorável boca que tem.
Lembro como se fosse ontem a rechonchuda com marias-chiquinhas saindo do maternal e indo para o happy-hour comigo, no posto da Nilo. O ritual de todos os dias: no colo para alcançar o balcão, pedindo seu pão de queijo e depois, ainda no colo, na mesa de
complementos para o cachorro quente: queijo ralado, batatinhas fritas, salsinha.... Não podia pôr no pão de queijo mas quem diria não para ela? E com isso, sentada no alto banco, com os pés balançando no ar, comendo.
Havia na loja de conveniências do posto um armário tentação, tipo pega-crianças: bonecos, carrinhos, jogos, tudo ali, exposto, tortura para os pais, êxtase na criançada. E a pequerrucha sabia e conhecia: logo aprendeu a olhar com os olhos e não com os dedinhos, e ali ficava.....

Tempos difíceis, tempos agradáveis.

Lembro como se fosse hoje pela manhã já em São Paulo, no pós Porto Alegre: o sotaque de paulista misturado com uma pitada do baianês da Nena, e nunca esqueço no dia de seu niver de 5 anos, indo para a Waldorf pela manhã, com o vidro do carro aberto para que o mundo ouvisse o “Aniversário” do Palavra Cantada, tocada no CD e cantando junto, onde ela se sentia bem maior do que era antes e que crescera bastante. E para que todos soubessem que era ela a aniversariante, bem maior do que um elefante.

Tempos difíceis, tempos agradáveis.

Lembro como se fosse hoje a tarde, sentadinha com os olhos arregalados assistindo um teatrinho da turma da Mônica no shopping Eldorado e levantando o deducho gordinho, ou vice-versa, para que soubessem que ela queria subir ao palco para sei lá o que fazer, quando a Mônica perguntou quem queria…. Ela queria, tinha vontade e coragem, como tinha e tem.....

Nossa guerreira!

Tempos difíceis, tempos agradáveis.

As voltas que o mundo dá dão vida e chegamos na Espanha. Ela, 8 anos, sabia nada de espanhol e de catalão: o que? Isso é de comer ou beber? Sem problemas: com a coragem que tem, encarou mais essa e hoje ai está, falando nessas línguas mais do que o homem da cobra(essa só conhece quem viveu em cidades onde havia a praça da igreja onde havia o homem da cobra que vendia um remédio que curava de unha encravada a queda do cabelo, passando por consertar coisas que na época era proibido de se falar, e que tinha uma mala onde havia uma cobra - a sempre chamada Catarina – que ia lutar com o lagarto – o inevitável Pascoal: nunca se viu nem a cobra e nem o lagarto, mas a expressão “homem da cobra” ficou e até acho quedaí veio o dizer “cobras e lagartos”, embora não sei bem o que isso quer dizer, que dizer, sei mas não falo agora – ao menos – nem cobras e nem lagartos).

Tempos difíceis, tempos agradáveis.

E a menina cresceu, acho que durante a noite pois não lembro muito bem dela crescendo; muitas vezes não tive olhos para ver isso, outras tantas as voltas do mundo me tiraram um pouco da vida e eu perdi a mirada em alguma curva mais acentuada. Nem sempre estive atento, nem sempre desperto. Mas a certeza do amor que tenho por ti, Julia K, 13 anos, guerreira, protagonista e não coadjuvante, é o que me conduz nessas convulsões da vida e me faz ver alguma coisa de ti (não tanto quanto eu gostaria: perdoa), seja com os olhos, seja com as lembranças.

Quero te ver festejar os 14, meu amor! E gracias por existires.

Tempos difíceis, tempos agradáveis.


AIRTON KWITKO, teu pai.


Imagem: Julia na Barceloneta, Espanha, 2016.

Nenhum comentário:

Postar um comentário